domingo, 10 de agosto de 2014

Dar conselhos


Só dou conselhos aos outros, para me ouvir melhor… e é bom saber isso! E quando falo de outros,  estou a falar de mim… também é bom saber isto. Assim aprendo a escutar-me . Os conselhos que dou, afinal são para mim!
Chamo o filho de desarrumado e digo-lhe que não devia deixar a roupa no chão, só o faço para me lembrar de como sou desarrumada, sobretudo na minha mente, cheia de ideias pré-concebidas de como os filhos se ‘’devem comportar’’, e não podem ter  a sua própria organização, tem de ser a minha !

Digo ao marido que não devia gritar com a filha, só o faço para me lembrar de como eu grito com o marido e o acuso de estar a gritar com a filha e dos conselhos que lhe dou de como '' pais devem relacionar-se com os filhos'';  assim escuto os meus próprios gritos com a realidade e como afetam o meu bem-estar! Quem grita, afinal sou eu com o que vejo e me desagrada! Como sei que o melhor para a filha, para o seu crescimento, não é o pai gritar-lhe ?Não sei.

Chamo a filha de ‘’preguiçosa’’ porque estuda pouco e tira más notas,  só o faço para descobrir as mentiras que conto a mim … só assim é que descubro que se ela chumbar , sinto-me mal comigo e não consigo lidar com o que penso de mim … ‘’falhei como educadora’’, ‘’sou uma mãe ausente’’,  ‘’devia ter feito melhor’’… agora sim já consigo ouvir as ‘’más notas’’ que dou à filha, porque estou a impôr o amor condicional, ''passar de ano'' para eu ficar bem com ela e comigo ; e também oiço as ‘’más notas’’ que dou a mim , neste discurso mental infernal com que me auto-destruo e me causo mal-estar emocional e físico!

Digo ao meu pai que não devia meter-se na minha vida ! Só digo isto porque costumo meter-me na vida do pai, digo-lhe como se deve comportar, e em que assuntos se deve meter!  Verdade, verdade, eu devia meter-me nos meus assuntos ! Quando ando ocupada com os assuntos do pai, quem trata dos meus ? parece-me que ninguém ! Ah, é bom ouvir os conselhos que me dou!

Vejo colegas autoritários e afirmo e não gosto do que vejo. Acuso-os, digo-lhes como se deviam comportar ou então fico apenas pelo queixume a quem não me pode ajudar. Só falo de outros, para poder ouvir o que digo e assim me lembrar de que sou muito parecida àquela pessoas que censuro e poder encontrar as situações onde isso acontece ou aconteceu.

É uma oportunidade maravilhosa que estou a ter  para dar conta da minha mente autoritária a ditar as leis de como tudo ‘’devia ser’’, ‘’de como devem comportar-se  pessoas no meu mundo ideal’’.  

É uma oportunidade que dou a mim para descobrir o meu próprio mundo interior, que é feito de tudo o que vejo  nos outros, quer goste ou não.
E de me aperceber das regras que imponho a mim e me tornam a vida num inferno: tenho muito que fazer; não mereço desfrutar a vida; se não andar sempre a sorrir, as pessoas não se sentem bem ao pé de mim; se não estiver sempre disponivel, consideram-me má pessoa; dizer ''não'' ao que os filhos pedem, significa que sou má mãe! temos que ser uns pelos outros, mesmo que isso signifique abusar da minha integridade; se não concordar com as conversas de grupo, excluem-me e não sei lidar com isso; prefiro estar com alguém com quem não me dou bem a estar só ...

Afinal, tudo o que digo aos outros é apenas para me escutar, para me descobrir nos meus dramas. Só tornando-me consciente, poderei resgatar o meu poder e tomar decisões em amor.

Quando acuso alguém, estou a acusar uma parte de mim. É bom descobrir isto ! Agora posso fazer alguma coisa por mim!

Sem este fenómeno de projeções da Sombra eu não teria forma de saber o que está no meu Inconsciente e assim fazer as pazes comigo e aprender a amar cada parte minha que a Sociedade me ensinou a repudiar.  

Ângela Antunes

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